Bem-vindo, use nossas ferramentas de acessibilidade.
C C C C
A- A+
Por aí. /Ponto de Vista.

Ousada delicadeza

Exposição de Kazou Okubo é polêmica não pela nudez, mas pelas reações viscerais que propicia

8 de fevereiro de 2023
Ousada delicadeza

O corpo. Ah, o corpo. Essa matéria sobre a qual a cultura inscreve seus significados; a biologia busca afirmar seu determinismo e na qual a religião (tenta) aprisionar seus vícios e virtudes. É o corpo que nos coloca em cena e é por ele que existimos. E é por isso que sobre ele há eterna desconfiança. Quando nu então… De tão desnaturalizada, a nudez tornou-se objeto de vigilância e território de disputas e autorizações, que ora causa fascínio, ora causa repulsa, mas nunca, jamais, se faz indiferente aos olhos. E é em meio a essas tensões que precisamos entender a exposição fotográfica Vê Nus, de Kazou Okubo, com curadoria de Rosely Nakagawa, que encerra 09 de fevereiro, às 19h, na Arte Plena Casa Galeria.

Utilizando a técnica de High Key, se chegou a um resultado que borra as fronteiras entre a fotografia e o desenho, e que também possibilitou uma riqueza de detalhes impressionante – o que derruba o senso comum de que as vulvas são todas iguais. Não na obra de Kazou, na qual as diferenças entre as retratadas são evidentes.

Alguns podem dizer enxergar nus, mas, particularmente, acredito que a categoria não dá conta de explicar as 28 obras que integram a exposição. O que vejo são retratos, mas a partir de um lugar incomum: a vulva – o que tornou, e torna, o caminho percorridos pelo fotógrafo bastante difícil nesses 18 anos nos quais a série tem sido desenvolvida.

De objetificação ao questionamento de apenas retratar mulheres cis, passando pelo fato de que a técnica empregada torna possível se ver apenas linhas e contornos corpóreos sem que seja possível identificar a raça das participantes, Kazou viu seu trabalho se tornar alvo de levantes e, por vezes, chegou a ter sua participação cancelada em espaços para os quais já havia sido selecionado.

Mas isso não parece o ter abalado. Ao contrário. O que faria muitos abandoná-lo, para o fotografo foi a oportunidade de buscar diálogos e compreender de onde partiam essas críticas e quais, de fato, deveriam ser incorporadas para o tornar ainda mais potente. A principal delas, talvez, foi abandonar o antigo título, segundo o qual, dava uma dimensão de objetificação. “É um projeto aberto. Mudanças estão acontecendo”, reflete.

Nesse sentido, cabe também ao público estar aberto aos retratos, que são de uma beleza e delicadeza que pouco se vê em material desse tipo, mas sem torná-lo palatável. O incomodo é evidente em diversos visitantes da exposição. Do absoluto silêncio a ataques de risos, os seus corpos reagem e lançam sinais de que foram afetados. Como diria Anaïs Nin: “Foi a vergonha que a vestiu de repente, permeou seus gestos, nublou-lhe a beleza, os olhos, com uma súbita opacidade.”.

Vê nus é um convite, mas também um desafio ao olhar – o qual aconselho que seja aceito.

 

Serviço:

Exposição Vê Nus – bate papo com Kazou Okubo

Data: 09 de fevereiro
Hora: 19h
Local: Arte Plena Casa Galeria
Endereço: R. 89, 546 – St. Sul, Goiânia – GO, 74093-140

Fernando Matos

Jornalista, assessor de imprensa e comunicação. Apaixonado por pornografia, fotografia e artes em geral. Ah! Também tenho mestrado em mídia e cultura, mas isso eu sempre esqueço.

Baixe o e-book e saiba mais sobre.