Bem-vindo, use nossas ferramentas de acessibilidade.
C C C C
A- A+
Diário Textual > ...Relicário.

Embalando a tristeza

Hoje eu peguei a tristeza e coloquei ela no colo

22 de novembro de 2021
Embalando a tristeza

Foto: Engin Akyurt/Pexels

Hoje eu peguei a tristeza e coloquei ela no colo. Como uma menina que precisa de um cafuné, embalei ela com uma música de infância, e por um momento ela dormiu sossegada. Despertou ainda triste, mas já sem aquela agonia no peito que por ora a acompanha. Hoje a tristeza não soluçou, não chorou, não gritou. Hoje ela sofreu calada, como alguém que espera na estação de metrô, sem pressa de ir embora. Assim, pode esperar um metrô mais vazio, por minutos, até mesmo horas. Enquanto isso, fica ali, sentado no chão ou no banco da estação, vendo metrôs irem até virem, pessoas entrarem e saírem, vozes falarem coisas inaudíveis.

Hoje eu peguei a tristeza e coloquei ela no colo. E disse que essa pandemia está insuportável, e não vejo a hora de acabar. Que a vida tem que girar, pra um lado positivo, porque é mesmo muito triste ver as pessoas passarem necessidade. Falta de comida, ausência de afeto, limitação de perspectiva. Tem sido difícil não enxergar além da janela de casa, às vezes eu mal consigo ver o sol e o céu.

As nuvens continuam parecendo de algodão, e o infinito parece sempre algo distante. A diferença é que, agora, nesses tempos tão difíceis, o que antes era palpável ficou ainda mais longe. O que a gente idealiza, as pessoas que queríamos estar ou até mesmo reencontrar, estão em outros lugares, outras rotinas, outros planos. Algumas coisas que desejávamos muito foram adiadas ou até mesmo suspensas, e eu não vejo como continuar.

A tristeza, embalada no meu colo, dormiu de novo. E eu deixei ela quietinha em um canto. Porque a tristeza também nos ajuda a seguir em frente.

 

 

“A tristeza é senhora
Desde que o samba é samba é assim
A lágrima clara sobre a pele escura
A noite, a chuva que cai lá fora
Solidão apavora
Tudo demorando em ser tão ruim
Mas alguma coisa acontece
No quando agora em mim
Cantando eu mando a tristeza embora…”

Kalyne Menezes

Sou fundadora, diretora e coordenadora geral do Antes do Ponto Final. Jornalista, escritora e pesquisadora. Gosto de escrever, falo no podcast e apareço no vídeo para contar histórias de pessoas e lugares, de diferentes maneiras. Também gosto de ir atrás das relações entre Comunicação, Informação, Cultura, Cidadania e pessoas com foco no que é social e coletivo.

Baixe o e-book e saiba mais sobre.