Nos tempos da Itubaína quase todos os meninos que eu conhecia queriam ser jogador de futebol. Nada daquilo de ficar famoso, ser rico, não. Era para ser craque que nem o Pelé, de engraxate a melhor do mundo. Gol de bicicleta, ao vivo, no estádio, só podia ser um sonho alto. Os garotos faziam bola de meia, campinho na terra, usavam estilingue para derrubar frutas, jogavam bila e pião.
Já as meninas não pensavam muito sobre o que queriam ser. Pensavam em quais histórias iam inventar para brincarem depois da aula. Eram meninas-moleques, brincavam de boneca quando estavam sozinhas, mas gostavam muito mais de esconde-esconde, baleado, queimada, pega-ladrão, pique-gelo, elástico, adivinhação. Pintavam as unhas com os esmaltes das mães, brincavam tanto de desfiles de moda com roupas de adulto quanto de corrida no quarteirão valendo um privilégio para o vencedor.
Nos tempos que a Itubaína reinavam não tinha isso de controlar o tempo. A gente olhava para o céu de repente e já tinha acabado a aula, era hora do almoço. Mais um pouco, depois das tarefas no início da tarde, a brincadeira era garantida. Sem contar as exceções, como um médico ou um curandeiro, todos os dias eram dias sem tédio. Demorava a escurecer, cansaço não existia, fosse dia de sol ou de chuva. Energia não faltava para as brincadeiras ou para a imaginação. Nesses tempos só tinha uma coisa mais gostosa e saborosa que Itubaína: a infância.