Foto: Hans Braxmeier/Pixabay
Confesso que às vezes sinto que não sei mais como que se começa a escrever. Não é que eu não tenha praticado, é que tenho exercido um outro tipo de escrita e as crônicas, às vezes, ficam vagando dentro de mim procurando uma porta de saída para o mundo. Mas isso não é, nem de longe, uma afirmação triste. Pelo contrário, pois eu acredito que muitas coisas na vida – aliás, praticamente todas – precisam ser paridas por nós, e o texto não é diferente.
A gente precisa digerir a vida. Na sabedoria oriental, há correntes que consideram a digestão como o processo mais importante do nosso corpo, pois é por meio dele que adquirimos energia, filtramos o que é importante, “quebramos” os alimentos em nutrientes para o nosso corpo. A digestão acontece no centro do nosso organismo, onde está localizada a maioria dos nossos órgãos, e onde também geramos vida. Ali, no centro acontecem muitos processos importantes e que nos mantém em pé. E, se não digerimos algum alimento corretamente, nosso corpo reage com mal estar, alergias, doenças diversas. E, da mesma maneira que digerimos os alimentos, é necessário processar as emoções, as palavras, os sentimentos, os fluxos da vida. Quando não fazemos isso, guardamos situações mal resolvidas, rancores, mágoas. Deixamos de dizer o quanto gostamos de alguém, e também de nos manifestar quando uma pessoa nos machuca.
Eu penso que a digestão da vida pode ser como uma fruta ainda verde no pé, tendo dois principais caminhos a seguir. Se o desenvolvimento dessa fruta for interrompido, e ela não tiver concluído seu processo de amadurecimento, não tiver passado pelas fases necessárias, desde a germinação, ela vai cair do pé ainda verde, e vai voltar para a terra sem ter concluído seu ciclo. E, caso contrário, se ela conseguir amadurecer e se desenvolver até atingir o ponto ideal, terá passado por todo o processo, resistido a adversidades do clima e de fatores externos e, após ser saboreada e cumprir sua missão de saciar a fome de um animal ou de alguém será, provavelmente, germinada de novo pelo processo natural da vida.
Digerir não é, para nós, cumprir as etapas, simplesmente. Mas, como seres racionais, viver e estar presente em cada uma delas para tirar o máximo de experiência, aproveitamento e sabedoria em cada uma delas. Se tentarmos aplicar isso no nosso dia a dia, sem dúvida, nossa perspectiva diante do mundo será como a dos animais e plantas: seguirá seu curso natural.